PR4 PCT: Rota dos Ambientes Rurais
Castelo de Penalva (não confundir com Penalva do Castelo, sede do concelho, distando poucos quilómetros) é uma localidade muito interessante e que nos recebe com um cartão de visita de luxo. Um enorme painel de azulejos em que estão representados os principais 16 elementos do património religioso das diversas localidades da freguesia. Pintado à mão por uma ceramista da zona, Maria do Amparo, o painel posiciona-se junto a um afloramento granítico, sobre o qual foi construído um miradouro que disponibiliza uma fantástica vista panorâmica sobre o vale do Dão. Maria do Amparo é, aliás, autora de muitos painéis espalhados por todo o concelho de Mangualde. Com ateliê e loja nesta cidade beirã, o seu trabalho, bastante versátil e criativo, merece ser apreciado. Começámos o nosso trilho junto à Igreja Matriz de Castelo de Penalva, ou de S. Pedro, santo a que é dedicada. A ideia era visitar o seu interior, para apreciar os seus retábulos pintados pela escola de Grão Vasco, bem como os caixotões do teto da sua capela-mor, decorados com os padroeiros e santos das diversas paróquias do concelho. Autênticas obras de arte, mesmo à luz de olhares menos crentes. Infelizmente, estava encerrada, tal como acontece com muitas das igrejas por estas bandas, que apenas poderão ser visitadas mediante marcação prévia. Trata-se de um belíssimo edifício, cuja origem remonta ao século XII, apesar de ter sido demolido e reconstruído no século XVIII com o aproveitamento de algum material original. A visita ficará para outra altura. Ao percorrer estas aldeias, temo-nos deparado com algumas (boas) surpresas. E Castelo de Penalva é, sem dúvida, um desses casos em que, pelo menos aparentemente, e aos olhos de quem está de passagem, há alguma aposta no bem estar dos seus habitantes. A existência de um espaço, junto à igreja, equipado com aparelhos modernos de ginástica para o usufruto da população é disso exemplo. Um toque de modernidade que, apenas inicialmente, causa alguma estranheza quando comparado com a antiguidade do edifício que lhe serve de cenário e com vista para uma paisagem idílica. Destacam-se também as moderníssimas instalações do Centro Social Paroquial, construídas a pensar na saúde e bem-estar dos respectivos utentes, mas também abertas à população em geral, disponibilizando serviços como a hidroterapia, sauna, banho turco, fisioterapia e ginásio. Mais um apontamento, aparentemente fora do tom, mas a provar que, afinal, boas práticas ainda vão acontecendo por aí…Junto à igreja, há todo um conjunto de pontos de interesse. Uma metrópole medieval, com sepulturas escavadas na rocha, mostra bem a antiguidade daquelas terras; e o Penedo dos Mouros, onde terá existido um castelo, mas onde hoje apenas existem cordas, e de onde se abarca uma paisagem indescritível. Estava na altura de seguir caminho. Primeiro, dentro da aldeia, seguindo-se os caminhos rurais de paisagem muito diversificada. O trilho conduz-nos através de várias localidades, todas de traça beirã e todas a ostentar com orgulho as suas capelas, igrejas e alminhas, que são muitas. No que diz respeito a património religioso, este é um percurso particularmente bem ‘recheado’. ‘Pinga’, Bolo de Azeite e Facebook
Na aldeia de Soito de Vide, vivemos uma experiência memorável, daquelas que fazem o dia. Foi numa das não muito raras situações em que a sinalética não é clara e em que vacilavamos entre seguir pela direita, ou pela esquerda, sendo que a direita nos apontava um caminho que era, supostamente, o quintal de uma habitação. É verdade que muitas vezes temos de atravessar propriedade privada (faz parte destes caminhos), mas… um quintal??? E eis que apareceu uma senhora d’un certain age e nos confirmou que era mesmo por ali. Antes, porém, de nos deixar avançar, perguntou se não queríamos ‘pinga’. Pergunta meramente retórica, já que imediatamente entrou em casa, de onde regressou com dois copos de vinho na mão. Educadamente e, confessadamente, de bom grado, aceitámos. E também tivemos de aceitar bolo, ou folar, de azeite, uma iguaria de Páscoa muito típica na Beira Alta. Para comer ali e para levar para mais tarde. Ainda fomos convidados para a caminhada anual, organizada pela comunidade local (Junta de Freguesia e Associações) e pelo município de Penalva do Castelo, que seria dali a poucos dias, convite que, lamentavelmente, não pudemos aceitar. E quando perguntámos como poderíamos informar-nos acerca das datas daquele tipo de eventos, a resposta veio rápida: “Vem tudo no Facebook. Os senhores não têm Facebook?”. E com esta nos fomos!Entre área florestal, campos de cultivo ou breves troços de estradas secundárias, fomos passando por localidades com pormenores muito pitorescos (e pictóricos, by the way).
Chegámos à Lage das Pinguinhas, nome que encerra uma lenda, pois então. Consta que Jesus Cristo derramou ali várias pingas de sangue e que as mesmas ali ficaram marcadas. Como não acreditar?
Seguiu-se o Açude de Cantos. Um espetáculo! Este açude do rio Dão está enquadrado por uma envolvente paisagística de enorme beleza natural e convida a perder ali algum tempo… apenas a observar e a ouvir a água a cair. Ao ver as águas dos rios a correr com tanta força, é quase fácil entender como eles são também geradores de energia. Mais romanticamente falando, ainda são visíveis os restos de umas antigas poldras por onde antigamente se atravessava o rio. Sem dúvida, o ponto alto do percurso.Em Cantos, uma antiga escola primária leva a nossa imaginação até ao tempo em que aprender a ler era um luxo acessível a muito poucos. Que brincadeiras terão acontecido naquele recreio? Quantas reguadas terão sido dadas naquelas salas? Já fora da localidade, as ruínas de uma antiga capela (a do Divino Espírito Santo) contam-nos que conforto espiritual foi coisa que nunca por ali faltou.
Seguimos por uma estrada ladeada por afloramentos graníticos de tamanho bastante generoso. São muito comuns por estas zonas e, se nos detivermos a observá-los, facilmente, e com alguma imaginação, lhes encontramos parecenças, ora com elefantes, ora com leões, com focas, e com outros animais. São, de facto, bastante estimulantes para a nossa mente. Um pouco como as nuvens. Amiais, que também atravessamos e que avistamos de um plano superior, oferece-nos uma imagem muito bonita feita de muitos telhadinhos.
A empreitada estava a chegar ao fim, apenas nos faltava fazer a grande ‘rasgadinha’ do dia… por uma estrada romana, o que só demonstra que para se usufruir de coisas boas, por vezes, é necessário fazer alguns sacrifícios. Ou, numa versão mais moderna, “não há almoços de graça”.