PR2 PCT/MGL: Caminho dos Galegos | Rota de Santiago
Uma alminha de granito como que pousada em cima de um muro antigo marca o local de partida. Apesar da sua simplicidade quase ingénua, estes elementos escultóricos simbolizam religiosidade, fé e devoção, e por isso é comum encontrá-los nos sítios mais inusitados, desde caminhos rurais isolados até junto aos portões de algumas habitações. Imediatamente, entramos num caminho muito antigo, cujo piso é de lajedo em granito, sendo bem visíveis os sulcos deixados, noutras eras, por rodados de carroças. Quantas vezes e durante quanto tempo terão aquelas ‘estradas’ sido percorridas? E por quem? Não consigo deixar de me surpreender! Já os muros, parece que nasceram ali espontaneamente e não por obra e graça de mão humana.
Este é um caminho que evidencia a prática de agricultura de subsistência, bem como da pastorícia, já que, quase sempre, seguimos ladeados de campos de cultivo ou de prados, alguns ocupados por rebanhos. Aqui e ali, atravessamos pequenas florestas de pinhal, mas também de árvores como carvalhos, oliveiras, freixos, algumas de porte impressionante, sem esquecer as variadíssimas espécies arbustivas que conferem à paisagem aquele toque decorativo que muda de cor consoante a estação do ano. De facto, uma paisagem humanizada q.b., a não interferir negativamente com a natureza e biodiversidade.
Passamos pela aldeia de Pousadas e percorremos as suas pitorescas ruas. Ali, vive-se pacatamente, as ruas estão quase desertas. Sempre por caminhos rurais, dirigimo-nos para a já nossa conhecida Ribeira de Ludares, que fizemos questão de atravessar sobre as poldras em detrimento da alternativa ponte de madeira, tal como terão feito os verdadeiros peregrinos. As ribeiras surgem, geralmente, integradas numa paisagem de grande beleza, e esta não é exceção. Vale a pena fazer uma breve paragem para alguns momentos contemplativos. Neste dia, o céu estava particularmente bonito, pelo que tudo à volta ganhava um encanto ainda maior.
Seguia-se o antigo Hospital dos Peregrinos, a prova maior da passagem dos mesmos por aqueles campos. Hospital no sentido de ‘hospedagem’, ‘sítio onde se hospedam pessoas’, e não no sentido que, posteriormente, veio a ter de ‘local onde se tratam pessoas’. Atualmente, os alojamentos que acolhem peregrinos são designados como albergues. E que hospital! O edifício, quase em ruínas, é surpreendente, não apenas pela dimensão do edificado, mas também pelas áreas exteriores que abrange, onde se vislumbram grandes áreas de cultivo. A quantos peregrinos terá proporcionado abrigo? Muitos, certamente.
E, se lho pedir a sensibilidade, registe, por sua vez, o que viu e sentiu. O que disse e ouviu dizer.", José Saramago in Viagem a Portugal
Mais à frente, voltámos a cruzar a ribeira e iniciámos o regresso a Mareco. Através de um pequeno desvio, visitámos ainda umas antigas azenhas. Equipamentos do ‘antigamente’ que hoje consideramos pitorescos, mas que estão na base dos grandes avanços tecnológicos. No caso presente, a utilização da energia gerada pela movimentação das águas da ribeira para fazer funcionar o mecanismo de moinhos e azenhas. De engenheiro e de louco o homem sempre teve um pouco, essa é que é a verdade.
E chegámos ao ‘escorrega natural’, uma enorme e curiosa formação granítica que, por via da erosão, ganhou uma zona pela qual se pode escorregar. É uma experiência divertida, mas a reclamar algum cuidado.