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Caminhos Mil

"É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já.", José Saramago

Caminhos Mil

"É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já.", José Saramago

20.06.23

PR14VIS Caminhos de encanto da Bodiosa


Emília Matoso Sousa
20 abril 2023
 
O percurso | 16,4 Km |  251 m desníveis acumulados
Localidade | Bodiosa, freguesia do concelho e distrito de Viseu
 
O trilho de hoje decorre na Bodiosa, freguesia dona de alguns caminhos bem bonitos. É um trilho fácil de percorrer, apesar dos seus 16 quilómetros, sem descidas ou subidas de pendente dignas de nota.

20230420_133445.jpgPartimos da igreja matriz (as usual) e, poucos metros depois, passamos em frente à casa paroquial, uma casa antiga de traça bastante interessante, que está a ser alvo de obras de reabilitação, por sinal de forma muito bem conseguida. No exterior da casa é possível ver alguns elementos construtivos da antiga igreja, os quais acrescentam ao espaço algum charme. 

20230420_142826.jpg20230420_143107.jpgAvançamos um pouco e chegamos à Ecopista do Vouga, que percorremos durante um breve trajeto. A ecopista foi construída sobre a parte desativada do antigo ramal do Vouga e é uma obra digna de aplauso, ao disponibilizar à população em geral mais de 100 quilómetros paisagisticamente privilegiados para a prática de atividades desportivas ou de lazer. Esta ecopista entronca com a Ecopista do Dão, ligando Sernada do Vouga a Santa Comba Dão, passando pelos concelhos de Águeda, Albergaria-a-Velha, Sever do Vouga, Oliveira de Frades, Vouzela, S. Pedro do Sul, Viseu e Tondela, e podendo ser percorrida por qualquer meio de mobilidade suave (bicicleta, patins, cadeira de rodas ou a pé), num total de cerca de 120 quilómetros. Já pedalámos os 50 Km da do Dão (que liga Viseu a Santa Comba Dão) e vale muito a pena.

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Pouco depois, saímos da pista e seguimos por área rural até chegarmos a um caminho murado entre campos cultivados. Passamos pela fonte da Moita, onde os animais matavam a sua sede, e voltamos a entrar na ecopista que nos vai levar até à capela do Espírito Santo.

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Entramos em Bodiosa a Nova, onde podemos apreciar uma típica e antiga eira local com os seus espigueiros. Daqui, seguimos para Silgueiros. Até entrar na aldeia, temos a maior subidinha do dia, mas nada de assustador. Depois da capela de Sta Marinha, voltamos a entrar em campos e área natural.
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O destaque do caminho vai para o trajeto que agora iremos fazer entre muros. Um caminho extremamente estreito ladeado por uns muretes rústicos e antigos, como ainda não tínhamos visto nestas andanças. Muito pitoresco e muito bonito!

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Voltamos a entrar em Silgueiros e atravessamos por entre o seu casario. Um saco com pão pendurado numa porta, algo só possível nestas terras pequenas, indicia que ainda é cedo. Começámos a caminhada cedíssimo para 'fugir' ao calor de uma primavera que mais parece verão...

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Chegamos às eiras comunitárias da aldeia. Um conjunto bastante pictórico e a ilustrar bem como era, no passado, o ritual em torno dos cereais. Malhar, peneirar, separar os grãos, e armazenar. Tudo em conjunto e tudo no mesmo local. 

20230420_101618.jpg20230420_101733.jpgSegue-se agora um trajeto longo sem grande interesse, até Pereiras, que atravessamos, e seguimos viagem até à anta do Fojo. Um dólmen, ou anta, fragmentado e parcialmente completo, que é Imóvel de Interesse Público e que data do Neolítico Final, IV a III milénio a.C.. Situa-se num plano superior em relação ao caminho e está quase enterrado, pelo que passa quase despercebido.

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Seguimos caminho entre pinhal e carvalhal até Póvoa de Bodiosa. Espera-nos a capela da Sra da Saúde e a sua monumental escadaria, de cujo topo se pode observar a paisagem envolvente de Bodiosa. A monumentalidade da escadaria faria supor uma capela com alguma imponência e não uma pequena e simples capela sem qualquer beleza. Uma placa existente no local informa que a obra foi "executada pelo povo" em 1994. Já o calcetamento do largo foi "efectuado pela Comissão de Compadres" em 2007. É prática relativamente comum nos meios mais pequenos ser a comunidade local a assumir a realização de determinados melhoramentos. Não me parece um mau princípio!

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Descemos a escadaria e, novamente por caminhos entre campos, dirigimo-nos ao bonito moinho de Queirela, de onde avançamos entre campos de cultivo, estes um pouco elameados e atravessamos a ponte de Queirela, rústica e construída em granito tosco.

20230420_133445.jpgVoltamos à ecopista e por aí seguimos até alcançar a antiga estação de Bodiosa, totalmente recuperada e atualmente sede da junta de freguesia. O percurso termina poucos metros depois.

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A arte de trabalhar o estanho.
O encanto da Bodiosa não fica, no entanto, pelos seus caminhos. É que os seus estanhos artísticos são o primeiro produto artesanal do concelho de Viseu a receber certificação. E qual a razão desta produção artesanal na Bodiosa? A existência de minas na freguesia, onde se extraía o estranho, e também a presença da Sociedade Mineira do Paiva, onde se fazia a separação e tratamento desse minério. Ora, com a decadência da exploração mineira surgiu uma especialidade de dimensão artística, ou seja, os profissionais que tinham competências na manipulação de estanho começaram a criar peças artísticas e decorativas, algo que se mantém até hoje.
 
Como nota final, saliento que a pouca espetacularidade paisagística deste trilho é compensada pela riqueza e variedade da paisagem humana, seja nas aldeias que atravessámos, nos campos de cultivo, ou nas construções de um tempo passado que, sob a capa de simples e rudimentares, são a expressão mais evidente da vitória das competências do homem sobre as forças da natureza.